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Foto do escritorMichele Costa

Impressões: Marighella

Por muitos anos, o baiano Carlos Marighella foi considerado o inimigo número um da ditadura civil-militar brasileira. Nós sabemos muito bem disso. Para alguns, Marighella é muito mais do que um herói. Para outros, um terrorista - "bandido bom, é bandido morto".


Quando tive idade para "entender" (entre aspas, pois ainda era criança) o que era certo e o que era errado, minha mãe disse que houve uma ditadura civil-militar brasileira. Explicando de uma forma nada didática, dura, mas com muita calma, ela me contou que durante vinte e um anos, pessoas foram espionadas, sequestradas, presas, torturadas e assassinadas. No fim do diálogo, disse: "Se um dia, eu ver meus filhos dizendo que a ditadura não existiu, vou morrer de desgosto. Ela existiu, eu vi com meus olhos, foi horrível, com muito medo e sangue".


Hoje, vinte anos depois, percebo que minha mãe previu, de um jeito estranho, que o futuro repetiria o passado. Ao ver manifestantes nas ruas, em plena pandemia, pedindo a volta do AI-5, dizendo com orgulho que aquele tempo, durante os anos de chumbo, era muito melhor, me enoja. Quer dizer que é aceitável prender, torturar, matar, rasgar a constituição pela "família tradicional brasileira" que não quer que o comunismo invada o país? Lembremos, mais uma vez, que nunca houve comunismo por aqui. Foram os militares (a família tradicional brasileira, o cidadão de bem), que colocaram esse medo para dar um golpe no Brasil.


Dou toda essa volta para dizer que "Marighella" (2019), dirigido por Wagner Moura, surge em um momento ideal para debater sobre o passado, presente e futuro, além de acabar com as mentiras que envolvem o baiano. Se no seio familiar ou nas escolas não foi possível abordar o assunto, usemos o filme para debater. Ainda dá tempo de apresentar a verdade para as futuras gerações - os erros e acertos da luta armada, a importância da arte, o poder dos jovens e muito mais.


Inspirado no livro "Marighella: O Guerrilheiro que Incendiou o Mundo" (Companhia das Letras, 2012), do jornalista Mário Guimarães, "Marighella" narra a vida do guerrilheiro baiano entre 1964 e 1969, quando foi assassinado por militares em uma emboscada. Filmado com uma câmera na mão, no mesmo estilo utilizado por Glauber Rocha para trazer emoções ao telespectador, acompanhamos de perto as sensações e emoções dos personagens. Uma boa ideia para representar as trocas de tiros dos guerrilheiros contra os militares e as torturas (é possível sentir na pele).


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O filme é bom, mas peca em alguns momentos, como, por exemplo, não aprofundar a história, ações da Ação Libertadora Nacional (ALN) e os debates com os companheiros. Clara Charf, companheira de Marighella, aparece pouco. Vivida por Adriana Esteves, a história de Clara se perde, não tendo um rumo adequado. Outro ponto que deve ser levantado é a falta de informações daqueles que estão ao lado do baiano. Quem são eles? Para quem não conhece a fundo a história de Marighella, será difícil compreender quem é quem e qual a função de cada um. Outro ponto que incomoda, é a troca de nome de Sérgio Fleury para Lúcio. Por que não dar nomes aos bois?


O filme é longo, Wagner poderia ter cortado algumas cenas, mas os fatores citados acima, não prejudicam o filme todo que é muito bom! Seu Jorge encarna muito bem Marighella, assim como Bruno Gagliasso vivendo o militar sem escrúpulos. As atuações são dignas de aplausos em pé!


Um ponto que me chamou atenção foi ver que o filme conta com apenas três músicas, adicionadas apenas no início e no fim. Com trilha sonora assinada por Antonio Pinto, as canções complementam o filme no momento certo. Uma boa jogada!



Houve ditadura. Houve torturas e assassinatos. Nunca foi pela corrupção.


Carlos Marighella pode ser amado ou odiado, mas uma coisa é certa: ele amava o Brasil.


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