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  • Foto do escritorMichele Costa

As noites estreladas de Nathan Dies

Dizem que todos os nomes possuem um significado. Laila, por exemplo, é de origem árabe que significa noite, evocando a imagem de um céu estrelado misterioso. Essa interpretação pode ser vista em Laila, segundo álbum de Nathan Dies, que traz referências sonoras do Brasil e Nova Iorque, local que o artista mora, a partir dos caminhos percorridos. 


Encontrar (e seguir) um caminho é difícil, mas é possível - e Nathan é a prova disso: a trajetória do jovem músico ganhou forma em 2021, com Instinto. Como o título mostra, o disco contém músicas sinceras e verdadeiras sobre o dia a dia. Dies continua na mesma direção, mas com uma diferença: hoje, ele está mais maduro. Dessa maneira, Laila é um reflexo de sua vida pessoal, que distante de casa, vem criando seu espaço no mundo a partir da confluência de amigos de diferentes países que formam hoje sua principal rede de contato e apoio em Nova Iorque. 


Ao longo de 9 faixas, Nathan Dies aborda o amor, saudade e identificação territorial, sob as noites nostálgicas. Nas palavras de Nathan, este disco sinaliza uma tentativa de "adaptação através dos sons", o que explica o lado mais experimental do álbum. "É um disco com ecos no Brasil, mas que fala muito sobre o meu aqui e agora. É um exercício da saudade por meio da música. Mas é também um olhar grato a toda caminhada feita e em percurso por aqui ainda", explica. 


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Instinto, seu primeiro álbum, traz as vivências a partir de metáforas e símbolos. Já em Laila, você aborda as diferentes facetas da sonoridade brasileira e americana misturadas com melancolia. É possível ver o seu crescimento/amadurecimento de um disco para o outro. Você vê essas mudanças em você?

Bastante. Sinto que em Instinto eu estava tentando em que direção ir como artista tendo mudado de país - entender em que língua escrever, com que estéticas da cena local eu me conectava, o que era importante pra mim de manter sobre minhas raízes etc. Em Laila, eu sinto que fui entendendo mais meu lugar na cena em que estou, na relação que quero construir com a cena de onde venho no Brasil e na minha relação direta com fazer música. 


Instinto foi lançado em 2021, durante a pandemia, diferente de Laila. Os lançamentos dos discos foram diferentes para você? 

Muito também [risos]. Instinto foi feito como deu por questão da pandemia, sem show de lançamento e lançado num momento instável pra mim, tendo acabado de mudar de cidade ainda sem ter uma comunidade em Nova Iorque. Laila pude fazer com calma, com as pessoas que queria envolvidas com mais facilidade, testando as músicas em shows antes de lançar. O show de lançamento em si também foi muito legal, esgotamos os ingressos no Public Records, uma das minhas casas favoritas de Nova Iorque. Também fiquei feliz demais de ver minhas músicas conectando com um público cada vez maior daqui que não fala português, além de serem um abrigo para outros brasileiros morando fora e uma ponte de conexão com o Brasil. 


Laila revela a saudade do Brasil, mas também traz os diferentes caminhos que você percorreu em um novo lugar. Como foi trabalhar essa temática? 

Fui escrevendo as músicas de um jeito bem orgânico, processando o meu dia a dia, entendendo cada vez mais minha relação com Nova Iorque e com o Brasil a distância. Então não foi uma temática explorada intencionalmente a princípio, foi algo que aconteceu por ser o que estava se passando na minha cabeça. Chegou um momento que eu tinha quase 20 músicas escritas e percebi várias delas passando por essas temáticas. Aí fui enxugando o repertório pra focar nessa temática e ir criando unidade pro trabalho, entendo que essas músicas faziam sentido em um disco.


nathan dies
(Créditos: Raine Roberts)

Na canção "Laila" vemos Gabriel, centauro e sereias pelas noites famintas. Gostaria de saber o que te levou a trazer essas personagens e o que a noite significa para você. Podemos ser devorados quando a escuridão cai? 

A noite pra mim sempre foi uma mistura de religião com coragem, exploração e conforto. Eu cresci judeu e os feriados e rituais judaicos acontecem de noite, então uma parte grande da minha vida foi estar em rituais noturnos com a minha família e depois sair pra festas ou tocar shows. Essas duas coisas acabavam se entrelaçando, um anjo de uma história bíblica com um anjo dançando na balada, cantar rezas e cantar em shows. 


Em "Os Gatos Fazem Rima" você se pergunta se conseguirá sonhar por mais um ano. Já conseguiu chegar em uma resposta? 

Acho que tentar a vida em outro lugar sempre faz a gente se perguntar de vez em quando se fez a escolha certa - de deixar tanta coisa importante pra trás em busca de algo novo, desconhecido, sem raízes. Mas cada vez mais me sinto confortável por aqui e vejo mais perspectivas pra mim na cena americana que me animam pro futuro. Tenho cada vez mais orgulho do meu trabalho como produtor e dos artistas com quem estou trabalhando e cada vez mais construo uma relação com a cena da cidade. Também sinto que cada vez mais construo uma conexão remota com a cena do Brasil que me mantém enraizado em quem eu sou que me dá menos medo de estar morando longe. 


Ainda falando sobre a canção, você canta: "a dor só serve para viver melhor". Você acha que precisamos passar por uma dor para encontrar nosso caminho? 

Acho que a dor faz parte da vida, é inevitável passar por experiências difíceis. Nessa parte da música estava refletindo sobre quanta agência nós temos sobre o significado que damos pros nossos sentimentos, já que eles existem de qualquer maneira. 


"Num processo de oficina remota com o Romulo Fróes eu fui desenvolvendo essas canções e começando a encontrar uma unidade temática entre elas, cortando aquelas que não se encaixavam"

Em "Elefantes de Brinquedo" você canta: "e eu sem saber lutar, lutei sozinho". Por ser uma estrofe impactante, pergunto: como não cair de uma luta? Existe uma maneira? 

Na minha experiência até agora o coletivo é o que mais tem me ajudado a manter força. Família, amigos, construir uma rede de pessoas com quem podemos contar e que podem contar com a gente. 


Laila conta com diversas participações. Como foi feita a escolha dos músicos?

Eu sabia algumas sonoridades que queria explorar no disco - estrutura de canção mas nos permitindo ser experimentais com a mistura de percussão eletrônica com percussão tradicional brasileira, arranjos de corda, e a mistura do violão de nylon com uma sonoplastia mais solta. A partir desse conceito me juntei com Fernando Tavares e Gui Fuentes, que estão comigo na música há muitos anos, pra coproduzir e eu sabia que iam topar explorar esses caminhos juntos. A partir daí fomos pensando em outros amigos que poderiam entrar nessa visão e se interessar por ser parte da jornada. Eu e Larie sempre trocamos muita ideia sobre caminhos eletrônicos na música brasileira, o Romulo Fróes foi um grande mentor para mim no processo de compor, a Alici é uma grande parceira (fazemos muitos shows juntos em NY e eu produzi o próximo disco dela).



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