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Foto do escritorMichele Costa

O Leve Vazio de Marinho

Existem diversos entendimentos para as palavras "leve" e "vazio". Nós sabemos o significado delas, mas a compreensão é diferente para cada indivíduo. "Leve", por exemplo, é algo sutil, mas qual é a interpretação do outro para essa palavra? "Vazio" pode ser considerado algo, literalmente, sem nada? Incompleto de alguma substância ou sentimento? Esse vazio pode ser aplicado naqueles dias obscuros que vivemos, de um passado não tão distante?


Questões, significados e interpretações marcam as canções da banda Marinho. Sua história começou em Maceió alguns anos atrás, a partir da vontade de cantar e colocar para fora o que estava dentro de um indivíduo (o co(r)po cheio). O projeto começou solo, comandado por Rodrigo Marinho. Seguindo o estilo trovador, Rodrigo se debruçou na solidão e lançou "Sombras" (2017), primeiro álbum. No decorrer da história, o solo vira um trio, composto por Victor de Almeida (guitarra) e Joaquim Prado (piano, baixo, samples e synths). A solidão diminui com a chegada dos meninos, porém, dúvidas, angústias e perdas continuam rondando as composições da banda.


Três anos se passaram e "Leve Vazio" (2020) surgiu, alguns dias antes da pandemia. Não deu tempo de apresentá-lo ao público, do jeito que a banda queria, a única apresentação do álbum aconteceu no Teatro Deodoro, sem público, um leve vazio. Durante o isolamento social, o vazio ficou cheio, transbordando, resultando no recém single "Mesmo Tudo", composta por Rodrigo, refletindo o período de luto vivido pelo vocalista. A partir disso, o trio se viu diante de uma complexa questão: a falta de controle sobre nossa vida e a vida de quem está ao nosso redor.


Questiono novamente: o que é vazio? E porque dói tanto? Como canta Marinho: "a gente fez mesmo tudo?".


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Muita coisa mudou desde o início de Marinho. Pergunto: quais são as mudanças que vocês passaram?

Victor: Quer começar, Rodrigo? Já que você tá [no projeto] desde o começo…

Rodrigo: [risos] Eu acho que a principal mudança que é o retrato dessa coisa que a gente tem hoje é que esse projeto se iniciou sendo um projeto solo, né, mas Victor e Joaquim estiveram comigo desde o princípio e aí foi um projeto meio que ao inverso do que a gente tava acostumado, né. A gente costuma ver bandas que daí surgem projeto solo e esse projeto foi o contrário, foi um projeto que nasceu solo, de uma necessidade de fazer, de registrar músicas próprias e acabou virando um trio, uma banda… E eu sinto que sou muito privilegiado de estar com grandes amigos nessa - acho que essa é a principal transformação em termos estruturais e acho que ao longo dos trabalhos, as músicas foram ganhando uma identidade que está extremamente diferente das primeiras coisas que surgiram. Acho que é isso, Victor, se quiser completar aí…

Victor: Em relação a mudança, eu acho que também passa um pouco pelo fato de, sei lá… Antes da gente ser uma banda, a gente também é fã, né [risos]. É aquela coisa que a gente fala: não é só porque a gente faz música, a gente ouve muita coisa. Eu acho que as referências também vão mudando com o tempo. Do primeiro disco [Sombras, 2017] para agora [Leve Vazio, 2020] são quatro anos [de pré e pós-produção] - quatro anos trocando referências, trocando as coisas que a gente ouve e que também a gente tem vontade de fazer. Além dessa questão de um projeto solo virar um trio, acho que também tem essa coisa da gente - agora como trio, ficar trocando muita coisa do que tá ouvindo, do que tá fazendo, do que tem achado.. Acho que passa um pouco por aí. As coisas ficaram um pouco mais difíceis de ocorrer, né. Morava todo mundo em Maceió, Rodrigo acabou mudando para Recife; na pandemia, eu acabei parando em São Paulo e Joaquim ficou em Maceió, aí a gente acaba mudando um pouco o jeito da gente trabalhar, de conversar, de aproveitar o tempo que tá todo mundo na cidade.


Como a pandemia impactou vocês? Como vocês falaram agora, cada um ficou em um lugar - como a questão do isolamento, do não fazer música, a questão do não poder se juntarem. Como impactou a banda?

Victor: Cê quer começar, Joaquim?

Joaquim: Tá, pode ser. Então, eu acho que mudou muito a dinâmica, de como a gente se relaciona também. Antes, além dos encontros de banda, também tinha encontros mais casuais, frequentávamos o mesmo círculo social e tudo mais - então a gente tinha muito mais contato. A gente conseguia trocar bem mais ideias. Desde o início da pandemia, como o Victor tem a disponibilidade de trabalhar em home-office, ele foi passar um tempo em São Paulo, né, então, a gente mudou a forma de compor na pandemia, as músicas estão mais fragmentadas, então a gente vai juntando vários fragmentos, a ideia de cada um, e aí quando a gente vem aqui no estúdio é quando a gente meio que consegue consolidar, mais ou menos, o que temos em mente, o principal mapa da música - e a partir daí, a gente vai trabalhando. A gente também aprendeu a ser mais objetivo. Como o nosso tempo reduziu muito, então, as nossas decisões tinham que ser muito objetivas - a gente se prepara muito antes de entrar no estúdio, porque o Marinho sempre foi uma banda muito de estúdio, de produção, nunca foi aquela coisa de fazer muitos ensaios, compor em jam, compor dessa forma; a gente compõe de uma forma um pouco mais dentro do estúdio, experimentando várias coisas que não conseguimos reproduzir ao vivo.

Victor: Eu acho até interessante esse negócio que Joaquim falou, porque a gente preparou o disco, "Leve Vazio" foi o último que a gente lançou, saiu em… Foi fevereiro, gente? Ou começo de março…

Rodrigo: Foi em março.

Victor: A gente soltou o disco porque a gente tava com um show marcado de lançamento no festival que tem em Maceió, chamado Carambola. Ia ser um show grande pra gente, era um show que ia marcar, então a gente correu para lançar o disco [pra ficar] tudo certinho e duas ou três semanas antes, calhou de acontecer tudo que aconteceu. Naquele período inicial, que ninguém sabia o que fazer, a gente teve a experiência de gravar o show de lançamento do disco num formato de show em um formato sem público. Acho que foi a coisa mais marcante, fora aquilo que Joaquim falou sobre os termos de composição, mas acho que teve essa mudança também de pensar as ações pra esse formato, porque era um pouco difícil falar… Você ligava a televisão e a gente via “duas mil mortes por dia” e a gente falar “ouçam o meu single!” - a gente não tinha essa coisa. Mas como a gente tem falado sobre eses tempos, a gente já fazia alguns shows com a capacidade de 20% da casa antes de “virar moda” [risos], agora, em termos práticos, essa coisa da composição, do estúdio… Até porque a banda nunca teve uma agenda grande, até pela dificuldade de juntar todo mundo, mas acho que foi essas questão do estúdio e também das atividades de se juntar todo mundo.


A pandemia mudou todo mundo. E esse impacto é muito evidente no último single que vocês lançaram. Mas eu queria saber como que foi lançar um álbum durante a pandemia, não fazer shows, não se apresentar e fazer um lançamento sem público. Como que foi para vocês?

Victor: Eu acho que assim.. Pra começar, a gente não sabia o que era lançar um álbum na pandemia. A gente lançou o álbum antes. Para todo efeito, a gente lançou o álbum normal, o que aconteceu depois, eu acho que é um processo meio complexo, porque a gente lançou um álbum como se fosse um álbum normal, em um período normal. Menos de um mês depois, tava tudo fechado, tudo parado. Acho que foi um processo pra gente aprender o que fazer. O fato é que assim: acho que os meninos podem falar sobre o show do teatro, mas da minha parte, é um negócio muito estranho, porque a gente lançou um disco praticamente dois anos atrás, foi em março de 2020, a gente já tá agora em novembro de 2021, e aí fiquei muito pensando: a gente lançou já tem dois anos, não tocou o disco, ao mesmo tempo a gente tocou o lançamento online, mas não circulamos… Durante muito tempo, a gente tinha muitas conversas no grupo e Joaquim dizia: “acho que a gente partir para outra, fazer outra coisa”, mas aí eu falava “mas gente, deu tanto trabalho e já vamos partir para outra, de um jeito muito rápido?” - só que é aquela coisa, essa chave do tempo, eu acho que ficou muito confusa pra gente, porque pra gente é um álbum recente, que a gente não lançou, mas para a internet é um álbum que já tá velho; esse limbo, sabe? Parece que foi muito tempo, mas não faz; ao mesmo tempo que parece que foi pouco tempo, mas não faz… Acho que a gente ficou um pouco perdido por aí, acho que não é um mérito só da gente, mas acho que muitas bandas parecidas ficaram sem entender muito o tempo de lançamento, das coisas nesse momento. O que vocês acham?

Rodrigo: Eu acho que a gente ainda tá processando. Acho que o detalhe principal disso é o que Victor contou, quando a gente lançou o disco, a gente faz tudo por nós mesmo. A gente escreveu isso para ser lançado um mês depois. A gente planejou um negócio com certa antecedência e somente quando a gente escreveu lá e marcou a data de lançamento, foi que as coisas começaram a ficar grandes, começaram a ficar importantes e acabou gerando uma série de dúvidas que a gente não sabia no que acreditar, como se comportar e não tinha como voltar atrás. Até o anúncio do cancelamento do festival foi feito, a gente ainda tava naquela de “será que vai rolar? Será que não vai rolar?”. Pegando um pouco esse gancho do Victor, quando aconteceu [a pandemia] vamos ser honestos, vamos falar a verdade e lamentar que o disco tá sendo lançado numa oportunidade tão ruim, mas sendo sinceros, explicando para quem ouve a gente, pra quem gosta da gente, que realmente foi uma situação do acaso. Ao mesmo tempo que a gente tava, de certa forma, contentes em divulgar uma coisa que a gente gravou com muito carinho, a gente tava preocupado como as pessoas iam reagir a justamente a gente tá lançando [na pandemia]. A gente não queria parecer feliz, porque ninguém tava feliz com a situação… Foi bem complicado e a gente ainda tá sentindo isso, esses impactos todos e tem toda essa dinâmica que a gente começou a experimentar. Pra mim ainda tá bem novo - acho que essa distância, tudo que a gente passou, interfere na forma da gente criar, na forma da gente compor, mas a gente teve poucos momentos juntos - como Joaquim falou, a gente aproveitou melhor os momentos sendo mais objetivos. É tudo isso, ainda é um aprendizado.

Joaquim: Até porque foi uma reação que, apesar de já ter dois anos de pandemia, você junta esses dois anos em um ano só, parece que foi só um ano de pandemia. Não dá essa sensação que já se passaram dois anos - é um tempo congelado na vida da gente. Como a gente é uma banda pequena, do Nordeste, ainda mais do Maceió, é muito difícil trabalhar, competir, conseguir público e essa coisa. Então, a gente meio que ficou sem pressa, sem deadline para os projetos, porque ainda tá todo muito meio maluco ainda. A gente não sabe ainda se volta ou se não volta [para apresentações presenciais e com público], como que vai voltar e se a gente vai voltar do mesmo tamanho…

Rodrigo: Tamo indo, né…

É aquela coisa: a gente pode sonhar um pouquinho, mas nem tanto, mesmo que tenha uma luz no fim do túnel.

Joaquim: É aquela coisa, a gente tá junto ainda e já é uma vitória! [risos]

Rodrigo: Verdade! [risos]

Joaquim: Porque… Sabe, já não acontece nada, desencana, mas mantém a chama acesa. Uma chama olímpica, não apaga nunca. [risos]

E aí eu faço uma provocação para vocês: com a pandemia, como foi manter essa chama acesa? E por que continuar ainda mais em um país que sempre tenta acabar com a cultura?

Joaquim: Essa é fácil! É que a gente é chato mesmo e quem é chato não desiste. [risos]

Victor: Acho que tem uma coisa que justamente pesa.. A gente já tinha conversado sobre isso antes. Tem um amigo nosso, de Belo Horizonte, o Daniel Nunes, baterista do Constantina, e ele sempre fala assim: “se foi êxito, se foi certo, se deu bom, a gente não sabe, o que a gente sabe é que a gente precisa continuar de um motivo para continuar fazendo”. Mesmo morando longe, ele sempre foi um amigo que participava dos processos da gente, a gente acabava trocando muito material com ele e ele sempre dava muita opinião; e acho que uma coisa que pesou muito é que… Talvez a gente esteja fazendo por outras questões. Todo mundo aqui acaba tendo outra atividade, o Rodrigo é advogado, o Joaquim trabalha no estúdio, eu sou professor, e a gente meio que arruma motivos para estar juntos e o estar juntos passa por esse processo de fazer música. Os motivos são meio que esses, a amizade, a vontade de querer estar próximo… Um dia, se a gente brigar, aí não tem mais motivo para ficar junto.

Joaquim: A gente sabe o nosso tamanho e isso ajuda muito. Quando a gente pára para planejar, a gente tenta ser o mais realista possível. Nossas metas nunca são maiores do que a gente, por exemplo, a gente vai um pouquinho por vez… A gente vai avançando e vai alimentando de pouquinho em pouquinho e vai alimentando isso… A gente sabe que nunca vamos viver da banda, então, isso já é um passo pra gente continuar juntos, é algo, que no final das contas, a gente tá fazendo para se manter juntos, porque gosta, porque adora fazer música e a gente tenta se renovar dessa forma. Muitas vezes é quase uma terapia pra gente, se manter bem…

Rodrigo: Eu acho que existe uma relação de confiança muito grande em todos os aspectos entre a gente e acho que acaba sendo, até natural, se esforçar cada um no seu mundo, no seu universo, contribuindo para o outro, no mundo da amizade mesmo. Apesar do que o Joca disse, de que somos bem chatos, a gente realmente é e acho que eles são bem mais do que eu [risos], mas acho que essa chatice é exigência, é se cobrar e a cobrança vem porque a gente realmente gosta de fazer isso.

Além do estar junto, a gente pode entender que fazer música é como uma terapia, usada como escape para sair desse mundo?

Rodrigo: Eu creio que realmente o que nos une, de fato, é essa vontade de que nunca para de estar ouvindo ou fazendo música.

Victor: Agora, fiquei pensando aqui no “o que nos mantém juntos”, ele vai falar: “necessidade de terapia” [risos]. A música sempre foi um referencial e acho que na pandemia não foi diferente. Eu até lembro que a gente fez umas playlists no começo da pandemia com músicas mais contemplativas, umas coisas assim, de músicas que a gente tava ouvindo para tirar um pouco da cabeça [esse assunto]. De certa maneira, a gente olha pra trás e pensa: fora esse lado da pandemia [corte no áudio], muita parte do que a gente já viveu, ninguém nunca viveu algo parecido de alguma instância, mas a música sempre esteve presente na vida toda. Não é que se tornou terapia, acho que sempre foi terapia, de certo modo.

Joaquim: Pelo menos pra nós três, a música sempre esteve presente, desde a adolescência e até nos nossos grupos de amigos que a gente tocava na adolescência… Somos sobreviventes nesse sentido.


"Sombras" é um álbum mais cru, enquanto “Leve Vazio” é mais sentimental, diferente do primeiro. Como foi o processo entre um e o outro? O que levaram essas mudanças?

Joaquim: Quando a gente gravou o primeiro EP do Rodrigo, solo, eu trabalhei [nele], gravei um monte de coisa e mixei. Aí o Victor entrou junto nesse meio caminho, começou a guiar ele para o que a banda é hoje e nesse processo eu não participava da banda. Quando a gente sentou para começar a gravar o “Sombras”, eu comecei a me envolver mais ativamente na banda, tanto na produção do CD, quanto em outras coisas.. Aí quando a gente foi ver, eles insistiram para eu entrar na banda… Ele insistiu bastante e eu entrei.

Victor: Acho que também tinha uma coisa… Querendo ou não, quando a gente fez o primeiro disco, boa parte das músicas já estavam meio mapeadas, sabe? A gente já tinha a estrutura e só precisava gravar…

Joaquim: A gente tinha tudo, só captou.

Victor: Acho interessante, porque as músicas, pelo menos as que eu acho mais legal do “Sombras”, metade já tava pronto, a gente só gravou, e a outra metade a gente fez aí… Por exemplo, “Coragem” não existia, “Ventre” não existia, “Nova I” não existia - foram músicas que foram aparecendo. “Sombras” tem muita guitarra e para o próximo a gente ficou “não podemos fazer algo igual, de guitarra de novo”. A gente buscou outros jeitos de coisas que a gente conseguia fazer. Ao contrário do Joaquim, eu não sei tocar mil coisas, mas dentro do meu instrumento, eu pensava: “eu preciso… do pouco que eu sei fazer, eu tinha que achar um jeito de fazer diferente”. Calhou que “Leve Vazio” tem mais guitarras do que “Sombra”, mas não parece, que é uma coisa que a gente começou a pesquisar e aprender novos jeitos de tocar nossos instrumentos.

Joaquim: E essa é a diferença entre “Sombra”. Dentro da nossa cultura aqui, da banda, a gente tem uma obsessão muito forte de buscar timbres. Na época do “Sombras”, a gente tava explorando muito os timbres de guitarra mesmo, de guitarras diferentes. Quando a gente começou o “Leve Vazio”, a gente meio que já tinha tudo isso meio que resolvido, dentro do que a gente tava acostumado a fazer. Então, foi a partir disso que nós começamos a buscar outros recursos dentro do processo de gravação que, no caso, evoluíram para o que é hoje. Voltando um pouco à pergunta anterior, acho que essa coisa da banda não ficar no mesmo lugar, deixa que [ela] se mantenha viva também, porque a gente tá sempre se movimentando juntos.


Então, podemos dizer que vocês estão em busca de algo novo, de sempre sair da "caixinha" e buscar outras… Isso criou um processo de criação?

Victor: Não sei se pode usar “sempre em busca”, porque fica parecendo um negócio que não vai ter fim… Quando a gente lançou “Mesmo Tudo”, o próprio Dani disse uma coisa bem interessante - “não é uma música que move onde a gente chegou, aponta mais para onde estamos indo”, sabe? No sentido de que começa a mostrar… Se você pega “Mesmo Tudo” e vai ouvir junto com “Sombras”, parece outra banda; mas se você pega uma linhagem, dos discos caminhando, você percebe que existe um caminho percorrido para chegar em “Mesmo Tudo”, só que “Mesmo Tudo” é parte desse caminho aí, entendeu? É um negócio que ainda vai seguir, a gente tá gravando outras coisas, tamo pensando em outras parcerias, outras coisas que tire a gente desse lugar e repensar um pouco o método que a gente faz. A gente tá mais interessado em coisas que nos tirem desse lugar cômodo, sabe? De pensar a guitarra, o baixo, a bateria…

Joaquim: Acho que o que o Victor tá falando é que a gente não quer ser repetitivo.

Já que o Victor deu um spoiler de uma pergunta que eu ia fazer, aproveito o gancho e já faço: me chamou atenção no release a seguinte frase: ““Mesmo Tudo” é uma mistura que diz mais para onde estamos indo do que onde, de fato chegamos”. Para onde vocês estão indo? Vocês sabem qual é esse caminho?

Rodrigo: Acho que a gente ainda não sabe. Acho que, inclusive, depois de tudo pronto pra lançar, acho que é uma coisa nossa, bastante particular, e acho que os três acabam tendo essa questão, mesmo pensando muitas coisas diferentes, a gente tem um alinhamento aí. Acho que depois de tudo pronto, a gente começa a se questionar bastante sobre o mesmo tudo, mesmo! “Será que era isso? Será que vai dar certo?” Acho que a gente não sabe para onde estamos indo, mas a gente sabe que não pode ficar realmente, extremamente, repetitivo, apesar de não ter como ser tão diferente assim, né.



"Mesmo Tudo" foi feita durante a pandemia. Como que foi lidar com uma canção tão reflexiva sobre a vida?

Rodrigo: tem um lance das nossas músicas, de alguma forma, o presente daquele momento acaba sendo um coringa... Você acaba entendendo a música depois, de outras maneiras. O interessante dessa música é que eu comecei a escrever após a morte da minha mãe, que aconteceu no começo de março de 2020, antes da pandemia estourar. No momento em que eu fui para São Paulo, acho que eu tava no aeroporto, ninguém usava máscara, ninguém tava se preocupando ainda com a pandemia e em São Paulo tinha três casos confirmados... Quando eu voltei, estourou tudo. A letra veio de uma experiência que tava no pré-absurdo que aconteceu.

Quando mandei a música para Katty [Winnie, cantora e compositora alagoana], disse: "quando você tiver um tempinho, pega essa música e toca no violão só para eu mostrar para os meninos". Aí ela parou e produziu, fez uma mini-produção, pegou a música e colocou guitarra, voz, backvocal - fez uma coisa muito interessante e quando ela mostrou pra gente, aí deu aquele [faz um estalo com as mãos] start, a instigada. Tem essa coisa de ter sido [uma música] particular, mas que acabava se comunicando com tudo e... Não sei, parece que hoje, ela vai mudando de sentido.

Realmente, ela dá diversas interpretações. O que vocês acham disso?

Victor: Tem um negócio muito interessante. A música foi para a mãe, um momento pesado... A gente nem quis colocar isso na época no release, porque isso, querendo ou não, varia muito... Teve gente falando: "ah, mas essa música também é sobre ex-namorado, ex-namorada" e teve até gente que falou que a música era para o Lula [risos].


"Mesmo Tudo" tem um verso muito bonito: "a gente fez mesmo tudo?". Faço uma provocação para vocês três: vocês fizeram de tudo? O que é tudo para vocês?

Rodrigo: Acho que a gente não fez de tudo não. Uma coisa bastante interessante da gente é essa coisa da autoestima; somos um trio com autoestima baixa, então, isso acaba sendo cômico na maioria das vezes, a gente tira onda das próprias coisas, e acho que é isso: a minha autoestima não me deixa dizer que eu fiz de tudo. Tenho certeza que eu não fiz tudo e acho que tudo é ir ao extremo, ao limite, sabe? Não que precise ser doloroso, mas acho que a gente acaba se acostumando muito facilmente com as coisas da vida.

Joaquim: Eu faço de tudo!

Victor: Você já fez de tudo, cara? [risos]

Joaquim: Acho que é muito subjetivo, é uma pergunta que se pode esperar qualquer coisa como resposta. Eu não diria tudo, mas a gente faz o possível. A gente não mede muito esforço pra gente chegar ali ou vamos ultrapassar um pouco essa linha... A gente vai e tenta ser pé no chão. Mas no final do dia, a gente sabe que não fez de tudo, mas acho que a gente tá sempre no limite, né, até porque todo mundo tem uma vida, né.

Victor: Da minha parte é que no final do dia, eu não fiz tudo não. Nem fiz tudo, nem fiz o que deu... Sei lá, sobrevivi, acho que tá bom demais.


Já dizia Belchior: "viver é melhor que sonhar" e é isso que a Marinho faz: a partir da realidade, ao ver o copo cheio, a banda encontrou uma maneira para continuar vivendo, relembrar os passos e ver que o lugar que está é bom até o momento.


Marinho está em todas as plataformas de streaming de músicas.

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