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Oi vocĂȘ continua presente, Victor Heringer

Foto do escritor: Michele Costa Michele Costa

HĂĄ quatro anos e sete meses, assisto diariamente o vĂ­deo "oi vocĂȘ sumiu", que continua no canal do youtube de Victor Heringer. Perdi as contas de quantas vezes falei dele (do criador e da obra) para amigos ou das vezes que indiquei os livros para amigos. AliĂĄs, continuo me emocionando ao ver a literatura do escritor em livrarias e sebos de SĂŁo Paulo.


Nunca conheci Victor Heringer, mas deste a primeira leitura (talvez o poema "nĂŁo sou poeta"), considerei-o meu amigo - e um dos melhores. Depois vieram os vĂ­deos. "Tem tempo que a gente nĂŁo se fala, entĂŁo eu liguei, mas nĂŁo consegui te alcançar. A gente mora tĂŁo perto que hĂĄ interferĂȘncia. O tempo aqui no fim da rua estĂĄ calorento e o cĂ©u nem ameaça. VocĂȘ podia Ă s vezes aparecer na janela, piscar a luz trĂȘs vezes de madrugada, estou acordado tambĂ©m. Um abraço."


Assim como as palavras de "oi vocĂȘ sumiu", constantemente paro de responder mensagens de amigos - os motivos sĂŁo diversos. NĂŁo sei porquĂȘ, mas eles continuam me procurando. NĂŁo existe nenhuma interferĂȘncia, como Ă© mostrado no vĂ­deo, mas as notificaçÔes existem, assim como as figurinhas, gifs e emotions - novos modelos de linguagem para conversar. As palavras continuam existindo e cada dia que passa mais pesadas e muitas vezes impossĂ­vel de descrever os sentimentos ou vivĂȘncias. "OlĂĄ amiguinho dos fusos abalados".


Em alguns momentos, me pergunto sobre o processo de escrita de Heringer: serå que ele escrevia todos os dias? Caminhava após ficar longos períodos sentados? O que fazia quando tinha um bloqueio de escrita? Também me pergunto se ele realmente existiu ou se minha mente o criou para diminuir a solidão.


"Sempre achei que tinha vindo ao mundo nĂŁo para estar nele, mas para ter estado, ter sido, ter feito (...) Por pouco nĂŁo me livrei do incĂŽmodo de ter nascido. DaĂ­ em diante, foi a teimosia do sangue o que me manteve vivo." (O Amor dos Homens Avulsos)

Desde o dia que conheci Victor, minha vida mudou. (É curioso como um escritor, um desconhecido, pode fazer com a vida de uma pessoa.) Meu amigo me trouxe paz (ou algo que chegue a esse sentimento), me fez finalizar diversos cadernos sobre as vivĂȘncias diĂĄrias de uma vida desinteressante; me fez reler poemas esquecidos de MaiakĂłvski e relembrar com afeto de amores passados. Portanto, nunca mais fui a mesma.


"(...) Alguns morriam de amores, outros de bilhetes de loteria nĂŁo premiados, outros ainda de uma substĂąncia misteriosa que as tias mais velhas chamavam de bile preta e que magoava as pessoas. O marido tinha morrido de MaiakĂłvski, segundo a maioria das velhas, apesar de o atestado de Ăłbito rezar infarto agudo do miocĂĄrdio." (GlĂłria)

Gostaria de tĂȘ-lo conhecido para agradecer por suas palavras e pela intensa obra que deixou. JĂĄ que nĂŁo foi possĂ­vel, sigo reassistindo vĂ­deos, revisando seus livros e clamando as poesias. Agora, busco coragem para iniciar a leitura de "Vida Desinteressante" (Companhia das Letras, 2021). Diferente de Victor, sou covarde para finalizar as coisas - como seguir adiante sem os escritos do meu amigo?


JĂĄ sĂŁo cinco anos sem Victor Heringer - mas sĂŁo quatro anos e sete meses de "oi vocĂȘ sumiu", "GlĂłria" (7Letras, 2012; Companhia das Letras, 2018), "O Amor dos Homens Avulsos" (Companhia das Letras, 2016) e tantos poemas publicados em revistas, sites e blogs.


Continuarei assistindo "oi vocĂȘ sumiu" e torço para obter respostas sobre a vida, o mais rĂĄpido possĂ­vel. Obrigada por tudo, Victor Heringer.


©2020 por desalinho.

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