Jorge Amado e Dorival Caymmi foram dois baianos gigantes que usaram a arte para retratar a vida e hábitos do povo baiano. Em "Mar Morto" (1936), Jorge conta o nascimento, a vida e a morte de Guma, um pescador, um "homem do mar"; enquanto Dorival celebra as músicas de remadores, em "Canções Praieira" (1954). Ambos retrataram o mar, signo que está presente na música do paulistano Rodrigo Eugênio. O mar, selvagem e santo, é enfrentado diariamente por homens, que saem em busca de peixes, um trabalho perigoso que pode afogar e/ou matar - como canta Caymmi: "É doce morrer no mar, nas ondas verdes do mar".
Rodrigo lembra Ayrton Montarroyos - ambos são jovens e carregam uma carga poética necessária para os dias de hoje, aquela que acalma e abraça o ouvinte -, mas Rodrigo traz a essência do boêmio, herança de seu avô que lhe mostrou o estilo na infância: "Quando eu tinha uns sete ou oito anos, eu vivia no bar - não bebendo ou nada do tipo, eu vivia junto com o meu avô que era um grande boêmio e a gente ouvia junto Caju e Castanha, Adoniran Barbosa, Nelson Gonçalves, músicas que ouço até hoje".
Influenciado por Dorival, Jorge Amado, Jards Macalé, Maysa e José Mauro, o cantor e compositor caminha pelas ruas de São Paulo, principalmente no Centro Velho, local que se sente bem, procurando por uma esquina, casa ou um banco que seja possível compartilhar seu lírico poético, sua boemia e o saudosismo do tempo que não volta mais. "Eu acho que as músicas que mais ouço hoje em dia são essas músicas antigas. Além de ter uma memória afetiva, de "tempos bons", de quando você é criança… Eu percebo que elas têm uma carga emocional, uma carga lírica muito pesada. Extremamente pesada. Foi algo que eu não pesquei quando eu tinha 7 ou 8 anos, quando ouvia mais isso, como coisas que pego agora, por exemplo", ele me explica em nossa conversa pelo Zoom.
Como e quando você descobriu-se artista?
Isso é uma pergunta muito difícil, porque eu nunca não me identifiquei como artista [risos].
Jura?
Juro! Eu sempre fui muito apaixonado por música, assim em todas as artes, mas música principalmente, desde quando eu tinha… Sei lá, era muito criança. Veja bem, eu tinha 3 anos e tinha um pôster da Evanescence no meu quarto, minha mãe conta [risos]. Eu fui crescendo e eu só fui mudando de área em área para música. Quando eu tinha sete ou nove anos, eu vivia no bar… Não bebendo ou nada do tipo, eu vivia junto com o meu avô que era um grande boêmio e a gente ouvia junto Caju e Castanha, Adoniran Barbosa, Nelson Gonçalves, músicas que ouço até hoje. Mas eu realmente não consigo pensar no [momento em que] "eu não quero ser artista" - sempre foi algo na minha vida. Nunca consegui me identificar com outras coisas.
Foi muito também sobre família? Tá no DNA?
Não, infelizmente não. Minha família não tem nada a ver. Minha família é da área da saúde, com tecnologia… Alguma coisa que eu consigo me relacionar é meu avô que toca pandeiro. Meu avô toca uma percussão maravilhosa. Eu sempre fui muito ouvinte, isso me influenciou, mas não teve nada com relação familiar.
O que te chamou atenção na arte? Por que seguir esse caminho?
Por que não?! Tava na hora de quebrar um pouco esse paradigma da minha família [risos]. É uma coisa totalmente de identidade, sabe? Eu me identifico com esse tipo, com essa carreira, de música e arte. É algo que sempre esteve lá, que eu sempre senti isso… Se existe vocação… Desde pequeno e a primeira banda que eu tive, aos 10 anos, na época do Restart… Eu tinha uns 10 anos na época e na época eu formei uma bandinha com um amigo de escola que chamava Eyes. Quando eu tomava banho, eu ficava imaginando a capa do álbum - e eu não tocava nada na época! Eu era puramente "eu quero muito fazer isso". Mas como eu nunca tive recursos, desde jovem, para ter essa mobilidade, eu tive que esperar um pouco, já mais velho para conseguir ir atrás disso.
Você consegue me explicar ou achar alguma resposta do que te motivou ir atrás desse mundo? Talvez para fugir dessa realidade, talvez para fugir da parte da saúde, da tecnologia…
Em certo ponto sim, mas a busca é sempre em habilidade de buscar um sentimento. Por exemplo, quando alguém tá ouvindo alguma música, de algum artista qualquer, você tá sentindo alguma coisa. Minha família foi sempre ouvinte de música, esse crédito eu do para eles. Às vezes, minha família tá muito feliz ouvindo música ou até triste, porque a minha avó ouvia só dor de cotovelo - Maysa e olhe lá. Inclusive, Maysa foi uma coisa muito marcante para mim - acho que até foi por causa da Maysa que eu pensei: "putz, isso é muito legal!". A Maysa tem aquele vozeirão ferrado que ela tem e é um sentimento muito lindo que ela passa. Eu lembro de prestar atenção e eu quero passar isso. Música é sentimento. Acho que isso resume tudo: música é sentimento.
E o que você pretende passar com a sua música? Algum sentimento ou deixar livre para os ouvintes?
Depende de música para música. Acho que a maioria das minhas músicas, desse disco novo que tô fazendo, que tem toda uma estética, uma temática… Eu busco muito passar sentimentos semelhantes que o Dorival Caymi passou no primeiro disco dele, “Canções Praieiras”, que é aquela coisa mais cru, cancioneiro com o violão e contando histórias de algum lugar, de alguma cultura… Acho que pelo menos, na questão musical de som, não tem tanta… Sentimento assim, mas eu busco trazer nas letras toda essa questão de sentimentos.
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Assim como muitos adolescentes, Rodrigo Eugênio caminhou por diversos mundos, tentando compreender-se e encontrar o seu caminho. Aos 16 anos, participou de uma banda de black metal ao lado de amigos e até chegaram a lançar músicas no Youtube e em Fóruns. O rock ficou pouco com ele, apenas um ano, pois redescobriu a essência da música popular brasileira e seguiu por esse caminho. Aproveito para perguntar como foi essa mudança: "Uma resposta completamente sincera: aconteceu do dia para noite [risos]. Foi engraçado, porque eu parei de ouvir o black metal, eu me lembro até hoje, foi no final de 2017, quando eu estava prestes a completar 18 anos. Foi do dia para noite".
Assim que encontra seu caminho novamente, Rodrigo Eugênio lança seu primeiro single, "Nada Mais", gravada de forma totalmente caseira. O início de tudo.
"Nada Mais" é o seu primeiro single e foi gravado de forma totalmente caseira. Você canta e recita um encontro no transporte público. Como foi o processo da gravação e da escrita? É uma canção, meio recitada e que se passa no transporte público.
Eu lembro exatamente como eu compus essa canção. Ela, na real, foi uma junção de uma música que eu fiz um tempo atrás. O primeiro disco de MPB que eu lancei, tipo, ficou ruim demais. As letras em si, as melodias eram muito boas, mas eu não tinha noção de gravar, não sabia fazer nada assim, foi totalmente gravado caseiramente… Quando eu compus essa letra, eu percebi que encaixava com essa música antiga, eu tava voltando do trabalho, isso presencialmente, em 2019, tempo auge de pegar metro!
Eu tava muito triste, porque eu não queria arrumar um trabalho na época. Eu era compositor full time, fazia aula de canto, só que a idade bate à porta. Aí eu arrumei esse emprego e quando eu estava voltando do primeiro dia, eu tava muito triste, muito. [E me perguntava] "Será que é isso que eu quero fazer?" "Eu vou trair tudo que eu gosto", coisa de jovem de primeiro emprego, que não fazia nada e que hoje eu percebo o quão tolo eu estava sendo. Não era só porque eu tava arrumando um emprego que eu ia parar de compor ou coisa do tipo. [A gata invade a tela e se aconchega no colo do dono]
Quando eu falo: "você quebra o seu destino/você chora", foi nesse momento que eu pensei: "putz, será que eu quebrei o meu destino?". Enfim, eu percebi que tava completamente errado. Hoje em dia, por mais que eu não consiga me dedicar 100% do meu tempo para música, porque tô trabalhando, faço um monte de outras coisas - o tempo que eu dedico é sempre mais 100% produtivo do que antigamente, quando eu conseguia fazer isso o tempo inteiro.
Podemos entender que "Nada Mais" é uma quebra da adolescência para vida adulta?
Completamente. É a famosa crise dos 18 anos [risos].
Você muda completamente de "Nada Mais", uma música grava caseira, para “Infeliz Tragédia de Maria” - alias, uma ótima música! Parabéns!
Muito obrigado. Eu fiquei completamente inseguro, eu sou muito inseguro, com qualquer coisa que eu produzo.
Por que continuar fazendo arte, já que você tem essa insegurança? Você precisa fazer?
Não é como se eu precisasse, não tem uma força externa que me força a fazer isso, é uma força completamente interna, algo que gosto muito de fazer. Essa insegurança é comum para o compositor.
É aquela questão de "é boa o suficiente", certo?!
Sim, completamente isso.
"A Infeliz Tragédia de Maria" tem uma história por trás, né. E que história impressionante! Como foi para você ver uma mulher morta e fazer essa canção?
Foi um processo muito estranho, porque eu vi essa mulher morta, quando eu estava passando em frente ao Theatro Municipal de São Paulo, quando eu fazia um curso que era bem em frente ao Municipal. Ela ficou na minha cabeça por muito tempo, tanto que eu só consegui compor a música um ano depois desse caso. Foi muito triste. Você vê alguém morrendo como indigente é algo… Se você for parar para pensar, tem toda uma população, ainda mais em São Paulo, de moradores de rua que não tem RG, não tem identidade. Como eu não encontrei mais nada sobre essa mulher, pesquisei na internet, acho que ela foi um desses casos e isso é algo que me pega muito. Eu fico extremamente triste. Isso acontece porque a pessoa não tem direito a sequer um nome, uma identidade, sequer uma nota no jornal sobre a vida dela.
E a vida dela não vale nada. O ser humano não vale nada.
Isso me pega de um jeito, é aquela angústia do peito, é uma coisa horrível. Anos depois que eu compus essa música, eu tava tomando banho, muitas das minhas ideias de música surge tomando banho [risos]. Comecei a lembrar dessa história e… Eu pensei em um nome Maria, que é um nome mais comum. "Eu vou dar esse nome para ela, pelo menos ela vai ter um nome". Eu fui lembrando da história e a melodia… Eu fui muito inspirado na melodia de samba de fossa, que também vem da Maysa, essas músicas mais dor de cotovelo. A letra saiu em uma tacada só, fui pegando o violão, fui tocando e saiu tudo de uma vez só; eu só anotei.
Por que você acha que demorou um ano para compor a música? Por que retratar uma tragédia?
Acho que tem toda a questão da memória afetiva, porque eu cresci vendo muitas tragédias. Como eu falei, ao lado do meu avô, sempre que acontecia algum acidente ou sei lá, alguém se matava, ele me levava para ver - desde criança. O que não é algo exatamente muito legal para uma criança! Tragédias é algo que marca. É aquela coisa: você vê um acidente de carro e você não consegue parar de olhar, então, essa é uma das sensações que eu também quero e gosto de trazer - é algo narrativamente ruim, para assim dizer, é algo que fica na cabeça.
O que me chamou bastante atenção nessa canção, primeiro é o nome Maria, porque é um nome comum, mas também lembra Maria, mãe de Jesus. E se é uma santa, há um nome, mas por que outras Marias não podem ter uma identidade? A gente vale mesmo um dólar ou nada? Hoje em dia, me pergunto se a gente consegue sentir.
Como que São Paulo te impactou tanto nas canções?
Acho que São Paulo é a minha musa inspiradora. São Paulo é… Nem sei o que dizer. Eu acho que tenho um saudosismo muito grande com São Paulo. A cidade sempre vai estar em transformações, sempre vai acontecer esse tipo de coisa, mas tem algo de tão belo no centro velho de SP, aqueles prédios mais antigos, aquela arquitetura, exemplo é o Theatro Municipal, que é muito influenciada no centro de Paris. É uma coisa tão pequena, mas é algo que traz tanta vida para uma cidade - é a característica de São Paulo. Inclusive, uma coisa que me dói, que amargura muito o coração é que eu morei a minha vida toda em uma mesma casa, uma casa com piso de taco vermelho, que meu avô construiu antigamente, uma casa completamente tradicional… Eu moro em um bairro residencial que tem muitas casas antigas e pelo menos 40% das casas ao meu redor foram vendidas para construção de prédios. Prédios horríveis e isso me dói muito! São Paulo podia ser uma coisa tão linda, podia ter uma pegada única, mas acaba virando uma cidade de…
Concreto.
É, de concreto - e nem é um concreto bonito! É um concreto cinza ou bege
E todos iguais.
Isso também é uma parte que me pega. Se você for ver, todo prédio que saiu em 2015 para cá, são iguais - uma estrutura quadrada, reta, com provavelmente uma sacada branca ou bege, sem vida. Completamente sem vida!
Esse saudosismo que você tem, essa questão do fugir do que está sendo feito hoje em dia, fala muito sobre você, sobre o passado, que você aplica em suas canções.
Sim, acho que até acidentalmente [risos]. Acho que nas minhas canções de agora, refletindo no que você mencionou, tem um certo saudosismo no que São Paulo poderia ter tornado se seguisse o planejamento urbano que tinha antigamente. É óbvio que eu não vou focar nisso totalmente.
Em "A Infeliz Tragédia de Maria", a gente encontra um Rodrigo mais maduro. Você consegue fazer um panorama do passado e o agora?
Acho que o que mais mudou foi justamente o que você falou, a questão da maturidade. Acho que você muda muito nos seus 18, 19 anos para os 20 e 21. É um período muito curto, mas com muitas transformações. Algumas [transformações] que você nem imaginava que podiam acontecer e acabaram sendo maravilhosas. Em 2019, quando eu compus "Nada Mais" e gravei tudo em casa, eu nunca imaginava que um dia eu poderia ir para um estúdio, gravar e acabar fechando parceria com artistas que eu sou muito fã, como é o caso do Leo Fazio, que tocou clarinete na música. Foi uma surpresa muito legal e [mostra] que eu consigo e que agora eu tô conseguindo. É algo satisfatório.
O que mudou para você em fazer música na pandemia? Ou não mudou nada?
Eu acho que mudou… Eu me sinto mais pressionado para fazer. Por exemplo, eu tô em casa, sem fazer nada, de bobeira, eu fico "putz, por que eu não tô tocando violão? por que eu não pego esse tempo livre e vou gravar alguma coisa que falta? por que eu não tô compondo?". É uma coisa que me deixa louco, eu não tenho nenhum descanso na minha cabeça. É um pé no saco.
É assim que surge o processo de criação?
Quando eu tento fazer alguma coisa, quando me forço a fazer alguma coisa, não sai nada de legal, mas quando eu vou fazendo assim, [do nada], vai surgindo uma coisa muito boa. A última música que eu compus agora, "Fata Morgana", que não vai tá no disco - essa é uma coisa completamente separada - é o momento que chega no fim do dia, você encosta a cabeça para deitar e vem o ritmo, a letra e você fica: "que saco! eu só quero dormir". Eu não consigo dormir sem antes ir no meu grupo de WhatsApp comigo mesmo e gravo a letra e a melodia que tá na minha cabeça, ou escrevo, e trabalho com isso nos momentos de bobeira.
Você como cantor e compositor quer transmitir sentimentos. Nós, ouvintes, conseguimos compreender e enxergar quando você se apresenta no palco?
Sim, completamente. Eu acho que ainda mais por conta da pandemia, pelo streaming fica um pouco mais difícil de você realmente pegar a ideia do artista e o que ele quer passar. Eu acho muito mais legal tocar ao vivo, fazer show, porque você realmente sente e consegue ver a expressão que o artista vai passar, você tá cara a cara com ele. Ali, você vai sentir tudo que ele quer passar. Tudo é mais forte pessoalmente.
O que podemos esperar desse álbum que será lançado este ano?
Esse álbum é engraçado, porque eu tô com ele na cabeça faz muito tempo. Inicialmente ele ia se chamar "Tragédias em São Paulo", porque o que eu busco trazer nele é justamente… Minha ideia principal era contar uma história dentro de um disco, várias músicas que são semelhantes entre si, porém com letras diferentes, que no final vão se juntar e contar uma história. É algo que eu tô percebendo que não está sendo exatamente desse jeito, eu tô contando várias histórias ao mesmo tempo e terminando na mesma música. Vai sim ter uma linearidade, porém, intercalando com outras histórias também, até com tragédias reais ou fictícias. Por exemplo, tem uma música que eu tô trabalhando, que vai ser instrumental, e vai se chamar "Fantasmas da Rua Apa" que tem toda a história do Castelinho da Rua Apa que também é uma tragédia, mas é algo que eu busco trazer mais instrumentalmente.
Fantasmas, ruas, mar, tragédias e São Paulo são algumas das características que estarão em seu primeiro disco, intitulado "Morre Afogado o Capitão do S.S. Tiragosto", inspirado em, mais uma vez, nos baianos que começaram esse texto. Quando Rodrigo começa a contar sobre o álbum, lembro de uma passagem de "Mar Morto":
"(...) Os homens se olharam e como que se interrogavam. Fitavam o azul do oceano a perguntar de onde vinha aquela noite adiantada no tempo. Não era a hora ainda. No entanto, ela vinha carregada de nuvens, precedida do vento frio do crepúsculo, embaciando o sal, como num milagre terrível.
(...) Como está belo o mar com a lua alvejando tudo! Rufino está ali parado. Do forte velho vem uma música. Tocam harmônicas e cantam:
A noite é para o amor…
Voz possante de negro. Rufino olha a lua. Talvez ele pense, também que Judith não terá amor esta noite. Nem nunca mais… O seu homem morreu no mar.
Vem amar nas águas, que a lua brilha…(...)"
Voltemos ao disco. O que esperar dele?
Estava ansioso para falar dele [risos].
Então, fique à vontade.
É muito difícil dizer exatamente o que esperar do disco [risos]. Começo a pensar: como eu posso listar tanta coisa? O título dele, atualmente, é: "Morre Afogado o Capitão do S.S. Tiragosto", surgiu quando eu fui para Salvador, eu fui para a praia do Forte [um ruído interrompe a gravação, deixando-a um pouco mais baixa] e é uma coisa linda e como eu falei, conversa muito com a estética de marinheiro, de pescador, essas coisas meio "The Lighthouse" (Robert Eggers,2020), tanto que eu busco muitas referências não só na música, porque… Música é um fator importante para o disco, mas tem tantas outras coisas que envolvem, que podem até melhorar a música é toda essa questão de estética visual, sabe?! Para esse disco, eu tô buscando muito essa estética de marinheiro velho.
De onde você tirou essa ideia de marinheiro? De Jorge Amado?
"Mar Morto", de Jorge Amado. Tem também a música do Dorival que é a que eu mais amo, "É Doce Morrer no Mar", que está presente no primeiro disco. É uma coisa assustadora, assustadora de quão bom ela é e o quão bem ela passa toda essa ideia de estar no mar, o que é viver no mar.
E você já se afogou no mar?
Eu já tomei uns engoves do mar. Na piscina, eu só sei boiar e olhe lá [risos].
Mas é bom também morrer, porque lembra que a gente tá vivo.
Sim, sim. Ou lembra que a gente tá vivo para se arrepender, nunca se sabe. Mas voltando ao disco. Eu busco trazer muito além do sentimento de tragédia como a gente já comentou, é tudo uma questão lírica de poder expressar um sentimento, seja de um amor perdido, uma dor de cotovelo através das histórias. Era algo muito feito nos anos 30 liricamente. Acho que as minhas letras funcionam e as histórias que são compostas nas minhas letras, funcionam como uma alegoria de sentimento que eu quero passar. Eu busco trazer essa trágica boemia [risos]. Essa boemia trágica que é tipo, a boemia que sempre tem não ir para escuridão. Além de ter toda essa questão mais lírica, passando por um musical agora, eu dou Graças a Deus também, que eu tô conseguindo encontrar essa estética musical através só do meu celular. Eu fico muito feliz em conseguir modular instrumentos usando sintetizadores virtuais ou algo que baixei no meu celular e passar isso, incorporar isso na minha música, é algo que eu já fiz na música introdutória que também vai ser instrumental que será bem curtinha - eu quero trazer uma orquestra grande no seu fone que vai passar para cá [faz um gesto] e vai sumir e só ficar o violão. Essa coisa de crescer alguma coisa e depois comprime ela e fica nessa linha tênue…
Tem a música no final que é sobre a volta do capitão, voltando do mar, onde todo mundo achou que ele tinha morrido - e ele tá voltando semi morto, não como um zumbi, mas como se fosse o espírito dele, que conversa com "É Doce Morrer no Mar". Ele voltando e trazendo de volta a lua que ele levou embora, a lua volta - é uma resolução de história, que termina de uma maneira muito poética.
Rodrigo ainda não morreu no mar, ele pode ter se afogado em algum momento de sua vida, mas assim como o Capitão S. S. Tiragosto, ele renasce e canta, com seu violão, pelas ruas, para lembrar que é possível viver.
As músicas de Rodrigo Eugênio estão disponíveis no Spotify.
Rodrigo Eugênio é um arraso! Ótima entrevista! - Jedias Hertz